Tudo o
que pode dar errado acontece em dias de chuva. E sabedor
disso, o sujeito A decide ficar em casa.
Inventa
de escrever, mas não sai da primeira linha.
Sem
título
Sente
inveja dos filmes onde o escritor passa por um bloqueio criativo.
E após a
crise, da tormenta, a inspiração vem e resolve tudo.
Do nada.
Como se
fosse uma dádiva divina
Um
prêmio.
Ontem.
Ele esteve
perto da casa do sujeito B.
O sol
ardido como se ainda fosse verão.
Viu
roupas no varal.
Pensou em
queimar tudo.
Crianças
surgiram brincando.
Timidez é
medo.
Ansiedade
é pânico.
Luzes da
ribalta.
Finge
morrer.
Ouve a
mesma música milhares de vezes.
Pássaros
negros e famintos circulam ao redor.
Toma seus
remédios.
Entra em
alfa, beta.
Sonhos
não se realizam.
Vezes +
Vezes.
Faz um
workshop de acidez mental.
E os
dentes postiços bebem até cair.
"O
beijo não dado, saudades deixou."
Palavras
não mentem - já dizia a mãe do sujeito A.
Podem
tergiversar, inverter a ordem, sumir com o tempo, mas não mentem.
Inicia
uma carta de amor que ninguém mais lê.
Exibicionismo
puro.
Delira,
alucina e se vê sendo perseguido por sujeitos C, D e E.
O voyeur
aflora.
Imagina o
cabelo de ele ser solto por uma lufada.
A nuca
branca timidamente some.
Sexo às
escondidas.
A
penumbra precede a noite.
Afirma
ser de esquerda.
Sente
orgulho, mas vomita em ideologias.
Não
acredita no ser humano.
Misantropo
desde criancinha.
A chuva
volta a cair - com força.
Retoma a
carta inacabada.
De
promessas e brigas infantis.
De
ligações e e-mails esquecidos.
Procura
num cofre a chave de um cofre menor.
E dentro
do cofre menor há uma pequena caixa de cetim preto.
Uma
aliança cor de carne brilha no escuro.
Um sabor
estranho invade sua boca.
Lembranças
do sujeito B.
Vontade
de definhar e dormir para sempre.
Amanhã.
O dia
nublado convida a sair.
O sujeito
A, o escritor ou quem maldito seja
decide
caminhar.
Passa por
ruas onde antigamente haviam rios.
Para em
cima de um viaduto.
E na água
poluída repara num vulto de vermelho.
A tempestade
de ontem fez diversas vítimas.
Vítimas
sem nome nem paradeiro.
Conclui
que deve ser mais uma que vivia de medo em medo.
Com
pensamentos insanos.
E o amor
preso na garganta.
A sorte
foi deixada para trás há muito tempo.
Não há confissões.
Nem
lamentos.
Apenas um
crápula, um narrador que se satisfaz com a dor
dos seus.
Poetwittar
26-03-2016