Atocongo


estão me matando aos poucos
levemente
em suaves prestações mensais...

a poeira fina e acinzentada cobria todos os meus pertences.
cobria as folhas, as flores, as casas, os animais, as pessoas.

o povoado. a fábrica.
primeiro, veio a fábrica.
depois, os alojamentos familiares, os equipamentos.
na parte superior, a residência dos empregados.
na parte baixa, os operários.
um restaurante, uma igreja, um mercado, um ginásio, um posto de saúde, uma delegacia.
e uma escola, é claro.

e tudo cheirava a pó, pó de cimento.
ressecando as narinas.
minando as forças.
entupindo os brônquios.

a minha asma ficou fora de controle.
madrugadas movidas a excesso de ar comprimindo os pulmões.
xaropes, bombinhas, pastilhas e idas ininterruptas ao posto.
entrava em desespero e desejava morrer.
o meu pai suplicava pra não falar dessa forma
enquanto me abanava e encorajava.

muito dinheiro gasto. experiências mil.
suco de alfalfa e laranja, mastigar gengibre, beber xixi quente de bode e muita verbena.
médicos de todos os tipos e tamanhos.
horas e horas em salas de espera
e dinheiro, muito dinheiro jogado fora.
ouvi uma vez a minha mãe reclamar de tantos gastos
de tantas idas à cidade
dos meus contínuos ataques e recaídas.

e olhando em retrospecto, talvez tenha sido bom ter saído de lá.
deve ter sido um alívio para eles.
uma pausa para descanso depois de 17 longos anos...

to be continued.

Comentarios

Emilio. Poeta diletante. Homem frustrado. Não leu os clássicos, mas adora Bukowski e Woody Allen.

Emilio. Poeta diletante. Homem frustrado. Não leu os clássicos, mas adora Bukowski e Woody Allen.
"El hombre es la víctima de un medio que se niega a comprender su alma."