9 de abril de 2010

Deveria de ter 7 ou 8 anos. Era uma criança tímida, cheia de manias e neuroses. E num domingo nublado, a minha mãe pediu-me para acompanhá-la à nossa nova casa que estava em construção num bairro afastado do centro. Enquanto não terminavam as obras, a casa servia como uma espécie de granja ou algo parecido. Lembro que haviam patos, galinhas, porcos, tartarugas e até um pequeno macaco. E por um tempo, um pequeno bode também pernoitou por lá. Era preto com algumas manchas brancas no dorso. Simpático e muito brincalhão. Já na nova casa, a minha mãe decidiu ir à feira e como eu disse que não queria ir junto, me deixou só. Depois que ela saiu, percebi que me sentia muito bem, pois estava sozinho e se a minha mãe confiava em deixar-me assim era porque, com certeza, já era um pequeno homem.
A casa era grande e divida entre os aposentos comuns, quer dizer, sala, cozinhas e diversos quartos e o mini-zoológico. De um lado viviam os animais, do outro as pessoas. E eu ficava entre os animais apenas quando acompanhado da minha mãe. Olhava-a preparando e lhes dando comida, limpado a sujeira, varrendo a bagunça, etc, etc.
Mas naquele domingo que fiquei só, achei que poderia ficar entre os animais, sem qualquer outra companhia adulta. Abri a porta e saí pro quintal. Olhei os bichos, brinquei com eles, ri com as estripulias do porco e o acasalamento dos patos. Não imaginei que o pequeno bode começaria a me seguir por todos os lados. Do curral até o pomar, do pomar até o pardieiro. Onde fosse, o bode ia junto. Repentinamente, começou a me empurrar com a cabeça ainda sem chifres. Achei engraçado no início, mas depois comecei a ficar preocupado e com medo.
O bode não parava de me empurrar ou de tentar me acertar com a cabeça. Parecia um touro indomável a enfrentar a sua derradeira luta. Fiquei apavorado, irracionalmente apavorado. Tremia dos pés à cabeça. Fugi dele. Fui correndo até a porta mais próxima onde – depois de atravessa-la – ficaria no espaço dos humanos, são e salvo.
Mas – droga de chave – não conseguia abrir a porta. A chave estava emperrada e não conseguia gira-la nem pra direita nem pra esquerda. Enquanto isso, o bode já estava atrás de mim, enfiando a sua cabeça peluda entre as minhas calças. Comecei a gritar e pedir socorro. Comecei a chorar em desespero. Gritei, pulei, chutei e xinguei o maldito animal, mas ele continuava a me cercar e me empurrar. Minutos se passaram, mas na minha mente pareciam horas intermináveis. A minha mãe não chegava e eu cada vez mais desesperado.
Tentei mais uma vez. Girei a chave com todas as minhas forças até conseguir abrir a bendita porta. Entrei dento de casa não sem antes empurrar o bode pra fora. Bati e tranquei a porta e sentei no chão. Estava todo sujo e a minha calça toda mijada, mas ufa!!!, tinha conseguido me livrar do pérfido monstro.
Minutos depois, minha mãe chegou e vendo o meu estado me mandou pro chuveiro, ralhando comigo por ter sujado tanto as minhas roupas.
No mês seguinte, comemoramos o aniversário da minha irmã e o bode que me fez chorar, agora era uma suculenta perna de cabrito. Bom apetit!! Disseram todos. Mas eu não conseguia comer. Saí correndo e fui chorar no meu quarto. Ninguém entendeu, e só hoje tive coragem de contar.