1 de febrero de 2015

Moça me atropela


Navego sim. Navego.
Entre cores escaldantes 
e temerosa água fria.
Entre areia submersa 
e gaivotas urrantes.

Entre pausas e aspas
signos diversos.
Entre avisos de perigo
boias 
e círculos flutuantes
me solto
perco o controle
perco a visão
a voz
perco.

Entre paciência 
e dádiva
persigo sua
lembrança
fossilizada
na memória
de olhares raivosos
e penas ao vento.

Surto infinito.
Perdões abafados
clemência absoluta
vísceras expostas.
Moça me atropela.
Não direi nada.
Apenas irei pedir
pela minha Mãe
entre soluços.

BIRDMAN ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)


Fazia tempo que não ficava tão excitado com um filme. 
Não só pela temática, mas pela proposta, pelo risco assumido, pela paixão envolvida. 
Estamos presos à obrigação de sermos bem sucedidos, relevantes. 
Não basta sermos importantes para a família ou para alguns poucos amigos, é preciso aparecer nas manchetes dos jornais, surgir na TV, ser citado no Face ou no Twitter.
A nossa felicidade é medida pela quantidade de comments e/ou posts que iremos ter se sumirmos do mapa, de circulação, da vida...

Riggan: Listen to me. I'm trying to do something important.
Sam: This is not important.
Riggan: It's important to me! Alright? Maybe not to you, or your cynical friends whose only ambition is to go viral. But to me... To me... this is - God. This is my career, this is my chance to do some work that actually means something.
Sam: Means something to who? You had a career before the third comic book movie, before people began to forget who was inside the bird costume. You're doing a play based on a book that was written 60 years ago, for a thousand rich old white people whose only real concern is gonna be where they go to have their cake and coffee when it's over. And let's face it, Dad, it's not for the sake of art. It's because you want to feel relevant again. Well, there's a whole world out there where people fight to be relevant every day. And you act like it doesn't even exist! Things are happening in a place that you willfully ignore, a place that has already forgotten you. I mean, who are you? You hate bloggers. You make fun of Twitter. You don't even have a Facebook page. You're the one who doesn't exist. You're doing this because you're scared to death, like the rest of us, that you don't matter. And you know what? You're right. You don't. It's not important. You're not important. Get used to it.
Sam: Dad...

Esta tarde vi llover - Fito Páez & Armando Manzanero

25 de enero de 2015

Namoradas de papel

Aprecio os meus longos minutos de silêncio e contemplação.
Contemplo, logo existo.
Sir John Coltrane me disse uma vez para seguir em frente...
pelo lodaçal, sujando os pés (unhas compridas e remelentas).

Subo na boleia de um caminhão de rodas coloridas e metalizadas.

Com idiotas rindo ao longe.
Na paisagem estranha - o idiota sou eu, talvez.
Faço um selfie: sorriso aberto.
Grito. Desço. Ainda não vivi o suficiente.
Vago pelo mato.
Corto palavras.
Queimo pontes.
Circulo entre cabras copulando
a tormenta se acerca.
Raios e trovões.
Frio e chuva.
Deito na lama.
Acaricio meu pênis.
Adoro gatos e namoradas de papel.
O mundo gira em torno de mim.

Imagino cavalos em fuga 

meretrizes ao vento
pipas encharcadas
abelhas embrutecidas.
Sofro sem querer.
Choro sem pesar.
Elevo a voz.
Jovens sendo espancados no meio-fio.
E eu aqui, dando milho aos pombos.

Na esquina há um bar

Esquina é seu nome
ninguém que eu conheça
a bebida mais forte
paro de pensar
escrevo
deleto
deletério
diletante
num guardanapo
qualquer
Where is My Mind.

Mais um selfie. Não me reconheço

O copo - só vejo o fundo
Desisto e repito como se fosse um mantra
Mil vezes, mil vezes, mil vezes:
Nada me atrai
Nada me distrai
Nada me seduz
E continuo à deriva.