15 de junio de 2020

Las Chicas de Miraflores (revisitado)

Lembro como se fosse ontem. Pouco mais de dezesseis anos e sentado no banco de uma praça em Miraflores. Mirava "las chicas" saindo da escola. Todas em lindos uniformes: blusa branca, saia xadrez e sapatos impecáveis (zapatos de charol). Pequenos objetos de desejo separados pelo imenso fosso das classe social. E mesmo sendo de pele branca, elas não teriam olhos para um visível morador da periferia de Lima. 
Talvez se fosse menos tímido, talvez. 
Poderia contar que já era um estudante universitário e que conseguia assistir a filmes para maiores de dezoito. Mas havia tanto desconforto dentro de mim que vivia a mentir sobre as minhas origens, idade e esconder o bairro onde morava. Frequentar a faculdade em idade tão terna era, por um lado, uma proeza e tanto. Por outro, não era fácil conviver com tanta diversidade, machismo e crueza.

Mas aqui entre nós, mudando de assunto, se você me permite, o vazio continua o mesmo. Se há imberbes que pensam que o Exército lhes tornou homens - da minha parte penso que foi o fato de saber observar, 
a distância do país natal e a ausência e/ou saudade - que me fez aquilo que sou hoje.

Soledad y Olvido, era os nomes das duas meninas que pararam e me convidaram a dançar na Paloma de Barcelona. No meio de tantos, elas escolheram por mim. E eu disse NÃO. 
Sou travado - já me disseram. E poderia até concordar se houvesse algo dentro de mim a ser solto, destravado, libertado...
Enfim, não passo de um doente mental. Um ser químico, cheirando mal.


Publicado originalmente em 24/8/13.